Gastronomia

Volta a Portugal em doces de Natal

Dezembro 12, 2024 · 3:49 pm
Image by freepik

Natal é o aroma inconfundível da canela doce a perfumar a casa, são as rabanadas comidas ainda a queimar os dedos, é a azáfama que contagia toda a gente. São as toalhas bordadas e a mesa bem-posta, a expectativa de quem espera e a de quem sabe que vai chegar. São os abraços, os reencontros, a casa cheia, mas também os lugares vazios daqueles que nos faltam.

A mesa de Natal simboliza mais do que uma celebração especial: é uma união de memórias, tradições e sabores que atravessam gerações. Entre as várias iguarias que fazem parte das mesas desta época festiva, os doces cuidadosamente preparados guardam histórias das famílias, dos lugares e até dos seus ingredientes.

Nesta Volta a Portugal em Doces de Natal celebramos o que torna cada lugar especial – uma forma doce de explorar o país e, quem sabe, inspirar a busca pela casa onde vai querer fritar os seus sonhos!

Mesas fartas, mesas pobres

Mesas fartas, mesas pobres, mesas partilhadas, mesas onde se dá e recebe. Muitas das receitas vêm de tempos difíceis, reinventam sobras, fazem do pouco muito, usam ingredientes acessíveis e aquilo que a terra oferece.

Açúcar, canela, água, farinha, pão e ovos: com mais ou menos toques de magia (entenda-se, amêndoa, gila, leite…) estes são os protagonistas de muita da doçaria tradicional que tem inúmeras variantes regionais, além daquele toque pessoal que cada par de mãos gosta de trazer a uma receita.

Assim, no norte do país, onde o clima frio pede aconchego, as rabanadas são enriquecidas com vinho do Porto, aquecendo as noites festivas. No Alentejo, a generosidade da terra reflete-se nas azevias de batata-doce e grão-de-bico. Nas ilhas, as broas e bolos de mel celebram tradições únicas moldada pelo mar e pela terra.

As melhores heranças, passadas entre gerações, são aqueles segredos guardados nos cadernos antigos e recriados com carinho em cada Natal. Mas mesmo que já tenha desistido de todo este rodopio gastronómico e prefira comprar tudo na pastelaria do bairro ou tenha trocado as toneladas de açúcar por alternativas mais saudáveis, os doces de Natal continuam a ser a alma da festa.

Norte: onde o Natal é rico em sabores

Volta a Portugal em doces de Natal
Image by chandlervid85 on Freepik

Na mesa de Natal nortenha, há clássicos que conquistaram já todo o território nacional.  As irresistíveis rabanadas (ou fatias douradas) nas suas múltiplas declinações, de leite ou vinho, polvilhadas, com calda, com ovos moles ou mel.

O desfile de iguarias continua com os mexidos ou formigos, doce de colher que aproveita sobras de pão e as enriquece com frutos secos e vinho do Porto; os bolinhos de jerimu, de abóbora, a sopa dourada, feita a partir de pão-de-ló demolhado em calda de açúcar e coberto de ovos moles.

Não parece haver limites nem criativos nem glicémicos na doçaria nacional.

Centro: no coração doce do país

Doçaria de Natal
No Ponto, CC BY 3.0 , via Wikimedia Commons

A zona centro do país guarda as origens da santíssima trindade do pecado da gula: os ovos moles. Bastam gemas, água e açúcar para fazer esta receita capaz de converter o mais cético dos mortais aos milagres da glutonia.

Também o Pão-de-Ló, de Ovar ou de Alfeizerão, é presença assídua nas consoadas, emparelhado com os bilharacos, fritos de abóbora que disfarçam na feiura o melhor dos sabores. Mas também não pode faltar a travessa de aletria doce, a curiosa lampreia de ovos e as filhoses beirãs que, com o seu toque de aguardente, eram tradicionalmente tendidas no joelho das cozinheiras junto à lareira. A filhós, que tem a massa preparada com farinha de trigo, ovos, leite, fermento e azeite, varia em forma e feitio nas diversas regiões do país.

Lisboa: tradições reais

Volta a Portugal em doces de Natal
Heather Cowper from Bristol, UK, CC BY 2.0 , via Wikimedia Commons

O clássico em forma de coroa foi o que de melhor restou das invasões francesas: o bolo-rei terá origem no Gâteau des Rois e tornou-se popular no nosso país durante o século XIX.

O primeiro estabelecimento a vendê-lo foi a Confeitaria Nacional, em Lisboa, mas rapidamente se propagou sendo agora um dos mais adorados filhos da nação. Recheado de frutos secos e cristalizados, cada fatia deve ser à francesa, que é como quem diz, grande! Atualmente, já existem variedades como o bolo-rainha, o escangalhado, o de chocolate e o de chila.

Também as broas castelares nasceram na capital. Terão sido criadas pelos irmãos Castelar, proprietários da Confeitaria Francesa, situada na Rua do Ouro, na Baixa da cidade. São pequenas e discretas, mas guardam um paladar surpreendente. A mistura da batata-doce e da amêndoa aromatizada com laranja não desilude e o tamanho reduzido faz-nos acreditar que também é pequeno o tamanho da nossa gula.

Alentejo: a tradição na simplicidade

Doçaria de Natal
Imagem de chandlervid85 no Freepik

Quem nunca se deliciou com uma azevia ao pequeno-almoço desconhece ainda os prazeres da vida. Não será para estômagos fracos, mas para espíritos fortíssimos que fazem do amor à doçaria de Natal uma tarefa sem horas de descanso. Este doce frito tradicional do Alentejo guarda na sua barriguinha de meia-lua recheios de grão, gila ou batata-doce, complementados por amêndoa.

Tal como as azevias, também os coscorões há muito que galgaram as fronteiras das suas origens alentejanas, conquistando mesas de lés-a-lés, no Natal e não só. A massa de farinha e ovos, estendida numa tira larga e estaladiça, pode ser polvilhada com açúcar e canela ou mergulhada numa calda de mel. É uma daquelas escolhas impossíveis…

Algarve: doçura a sul

Volta a Portugal em doces de Natal
Foto de Martha Dominguez de Gouveia na Unsplash

A sul, terra de amendoeiras e figueiras, sente-se a influência árabe na arquitetura e também nos paladares. Aqui, a massa de amêndoa e açúcar transforma-se em pequenos frutos, objetos e animais elevando a maçapão a uma categoria artística. Não são específicos do Natal, mas os Doces Finos embelezam qualquer mesa e encantam o palato.

O Morgado de Figo também merece lugar cativo nas mesas algarvias, casando figos e amêndoas numa pequena delícia exótica. Brilham também as Filhós de Canudo, surpreendentemente enroladinhas e cobertas de mel, as azevias de batata-doce e o folar de Olhão, nas suas camadas de sabor.

 Açores e Madeira: Natal exótico e tradicional

Doces Tradicionais natalícios
Foto de Tim Douglas : no Pexels

Nenhuma parte da gula nacional ficou perdida na travessia atlântica para os Açores e Madeira. Também nos arquipélagos o Natal é uma celebração de sabores ricos e tradições profundamente enraizadas e ajustadas às especificidades de cada ilha e ao carinho das famílias que as preservam.

Nos Açores, o protagonista é o majestoso Bolo de Natal, também conhecido como Bolo de Fruta, preparado com duas semanas de antecedência e guardado em papel vegetal, num lugar quente, para intensificar os seus sabores. Os coscorões estaladiços e as filhós de forno, macias e aromáticas, completam esta doçaria natalícia tão característica.

Na Madeira, é o aromático Bolo de Mel que assume o lugar de destaque. Rico em frutos secos, mel de cana e especiarias, é uma verdadeira celebração de sabores intensos e duradouros. Diz a tradição que quanto mais velho, melhor o sabor. As broas de mel e de especiarias, pequenas delícias perfumadas com canela e erva-doce, são a companhia ideal para acompanhar um cálice de vinho Madeira e brindar a mais um Natal.

Terminada esta Volta a Portugal em Doces de Natal, périplo impróprio para diabéticos ou para quem goste de cumprir dietas rigorosas, devem erguer-se agora as vozes revoltadas que enumeram esquecimentos. “Então e os sonhos? Como é possível não estar o tronco de Natal? Falta o bolo inglês? Deixaram de fora o arroz-doce? E os 7.685 doces conventuais regionais em que Portugal lidera destacado qualquer ranking de hiperglicémicos?

Uns por povoarem todas as mesas, de norte a sul, outros por não serem específicos desta época, (mas bem-vindos todo o ano), ficaram fora deste texto, mas nunca postos de parte no coração da nossa afincada gulodice.

Seja qual for a região do país, as tradições mais doces são sempre aquelas que unem as famílias à volta de uma mesa. Feliz Natal!

Passeios

As mais curiosas tradições de Natal

Há para todos os gostos: frango frito, "piñatas" e até carpas na banheira!

Dicas

Presentes perfeitos: 10 ideias originais e inspiradoras para este Natal

Esqueça as peúgas, os chocolates, os "gift cards" e descubra os presentes que vai querer oferecer neste Natal!

Decoração

As Árvores de Natal mais originais do TikTok

Diz-me que Árvore de Natal queres, dir-te-ei quem és…

Leia mais

Habitação

Parlamento aprovou 302 “novas freguesias”

Medida terá de ser promulgada pelo Presidente da República.

Profissionais

Venda de casas dispara no final de 2024

Os preços continuam a crescer, mas registou-se um abrandamento.

Habitação

Taxa de esforço impede acesso de jovens à garantia pública

Os bancos já têm milhares de pedidos de jovens para crédito habitação com garantia do Estado

Habitação

Montenegro afirma que “em princípio” nenhuma casa do PRR será construída com nova lei dos solos

Primeiro-ministro defendeu que legislação está elaborada “para garantir transparência e legalidade”.