Habitação
Risco de corrupção combate-se com transparência, diz Helena Roseta
Janeiro 16, 2025 · 10:11 am
Image by Frank Nürnberger from Pixabay
A arquiteta Helena Roseta defendeu esta quarta-feira, no parlamento, que o risco de corrupção apontado à construção em solos rústicos se combate com transparência, divulgando consultores do Governo e autarquias, e defendeu a fundamentação na mudança de usos dos terrenos.
“A principal forma de combater o risco de corrupção chama-se transparência, transparência nas decisões, transparência nos dados e participação dos cidadãos antes de as decisões serem tomadas, cumprindo estas regras nós prevenimos grande parte dos riscos da corrupção”, afirmou Helena Roseta.
A antiga deputada pelo PSD e PS falava numa audição no âmbito da apreciação parlamentar do diploma que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), publicado pelo Governo em 30 de dezembro, que permite a reclassificação de terrenos rústicos em urbanos por deliberações municipais.
Transparência nas decisões
Para a antiga autarca em Cascais e Lisboa, é importante saber “quem são os consultores externos” a que se recorre, “quer quando o governo faz determinados diplomas, quer quando as autarquias o fazem também”, porque o diploma aprovado “diz que os pareceres podem ser dos serviços da câmara ou de consultor externo”.
“Acho isto um risco, evidentemente que as câmaras não têm esta capacidade e algumas precisam mesmo de consultor externo, não sou contra isso”, apontou.
Contudo, acrescentou, se a maior parte das assembleias funciona com os serviços que a câmara lhes empresta, “não há qualquer autonomia e independência das assembleias municipais”.
Nesse sentido, pugnou por “transparência, consultas externas a consultores privados transparentes”, para não haver o risco de as decisões, não só as das autarquias, mas também “as do governo”, ficarem “confiscadas por pareceres de consultores” que não se sabe “quem são”.
Diploma não altera Lei dos Solos, defende
Salientando que o atual diploma “não é uma alteração à lei de solos”, que já foi efetuada pelo anterior diploma do Partido Socialista com o “‘simplex’ urbanístico”, Helena Roseta referiu que agora se permitirá passar de solo rústico a urbano sem plano.
“O ‘simplex’ urbanístico e este são diplomas que foram promulgados em tempos mortos, o ‘simplex’ urbanístico foi promulgado em janeiro de 2024, quando o governo já estava em gestão e já estava tudo a preparar a campanha eleitoral do próximo [executivo], e este foi promulgado entre o Natal e o Ano Novo, portanto aqui não há transparência, nem participação nem nada, é isto que nós temos que evitar, de pôr as coisas cá fora em tempo morto para ver se passa e depois não explicar”, criticou.
Com o atual diploma, basta que haja deliberação da câmara e da assembleia municipal, que já aprovavam os planos, mas com “uma data de exigências”, explicou.
Assim, sugeriu, “se reforçarem neste diploma as exigências de fundamentação e de transparência o risco é muito menor”.
Outros instrumentos além da reclassificação
A arquiteta notou ainda que há muitos instrumentos legais, na lei de solos e de bases da habitação que podem ser usados em alternativa à reclassificação de terrenos rústicos, como é o caso da carta municipal da habitação, que “permite densificar solo urbano”, ou na lei de solos “a utilização coesiva de solo disponível” ao fim de muito tempo sem uso.
“O combate não é ao solo que não está construído porque não pode ser construído, o combate é ao solo que não está construído porque está expectante, à espera da subida de preços”, frisou.
Helena Roseta referiu ainda que as autarquias devem usar medidas ao seu alcance, como o agravamento do Imposto Municipal de Imóveis (IMI) para “casas vagas” há muito tempo.
Além disso, continuou, há outro aspeto “muito perigoso”, que consiste na possibilidade de construção em áreas agrícolas, porque “vai criar guetos de trabalhadores agrícolas”.
“Um dia acaba a agricultura intensiva e vai ser um drama”, alertou.
Esquerda quer a revogação do diploma
A apreciação parlamentar da alteração do RJIGT foi pedida pelo BE, PCP, Livre e PAN, com vista à revogação do diploma.
Na audição, a deputada Joana Mortágua (BE) considerou que este debate “devia ter sido prévio à alteração da lei”, pela “importância e dimensão” que tem, e questionou se a alteração “pode ou não subverter completamente os instrumentos nacionais de ordenamento do território”.
Pelo PS, Maria Begonha criticou a ausência de debate e “consulta pública muito mais aprofundada” a um “diploma com esta abrangência”, adiantando que “não há qualquer hipótese” de ter o apoio do PS na sua versão final se “o conceito de preço moderado se mantiver”, em vez do conceito de “habitação a custos controlados e de renda acessível”.
A social-democrata Margarida Saavedra notou, contudo, que dentro dos perímetros urbanos há “diferentes componentes ambientais urbanas” que “proíbem qualquer tipo de habitação”.
Por outro lado, são precisas 120 mil casas e “o ritmo da construção não tem acompanhado o ritmo da necessidade crescente das pessoas”, referiu.
Marta Silva, do Chega, admitiu que o objeto da lei de promover mais terrenos urbanizáveis é “meritório”, mas alertou que, tal como está, “corre o risco de comprometer a transparência e permitir práticas que não servem de todo o interesse público, abrem a porta à desordem territorial” e até “ao agravamento do preço da habitação”.
Fonte: Lusa