Habitação
PR promulga simplex urbanístico do Governo com alerta para “entorse significativo”
Dezembro 27, 2024 · 10:00 am
Foto de Jack White na Unsplash
O Presidente da República promulgou esta quinta-feira o diploma que cria um regime excecional que permite a construção e urbanização onde atualmente não é possível, mas alertou para “um entorse significativo” no regime de ordenamento e planeamento do território.
“Apesar de constituir um entorse significativo em matéria de regime genérico de ordenamento e planeamento do território, a nível nacional e local, atendendo à intervenção decisiva das assembleias municipais e à urgência no uso dos fundos europeus e no fomento da construção da habitação, o Presidente da República [Marcelo Rebelo de Sousa] promulgou o diploma do Governo que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 80/2015, de 14 de maio”, pode ler-se numa publicação no ‘site’ da Presidência.
Aumenta oferta de solos para habitação
Em 28 de novembro, o Governo divulgou a aprovação de um decreto-lei que altera o Regime Jurídico dos Instrumentos de Gestão Territorial (RJIGT), permitindo o aumento da oferta de solos destinados à construção de habitação.
“Pretende-se garantir um regime especial de reclassificação para solo urbano, cuja área maioritária deve obrigatoriamente ser afeta a habitação pública ou a habitação de valor moderado. O conceito de habitação de valor moderado, agora criado, procura abranger o acesso pela classe média, ponderando valores medianos dos mercados local e nacional para assegurar a realização de justiça social”, podia ler-se no comunicado do Conselho de Ministros.
O ministro da Presidência, António Leitão Amaro, tinha explicado em 28 de novembro que as medidas procuram “cortar na burocracia”, nomeadamente através da criação de um “regime excecional” que permite, por decisão dos órgãos municipais construir, edificar, fazer urbanização onde hoje não é possível.
Em causa estão solos classificados como rústicos. De acordo com o Governo, 70% desta edificação tem de ser destinada à habitação pública ou a valores moderados, excluindo assim a habitação de luxo.
António Leitão Amaro precisou ainda que a medida vai proteger os valores naturais mais sensíveis, onde se inclui a Rede Natura (áreas de conservação de ‘habitats’ e espécies selvagens de risco), terrenos agrícolas de maior potencial e outras zonas de risco.
Associação Zero lamenta promulgação de diploma
A associação ambientalista Zero lamentou, em comunicado, a decisão de promulgação e diz que se o Presidente considera que a legislação constituiu um “entorse significativo” deveria ter impedido o risco de uma “lesão permanente”.
A associação recorda que o Governo, quando anunciou a decisão, mencionou a possibilidade de construção em solos classificados como rústicos e solos que têm classificação como REN [Reserva Ecológica Nacional] e RAN [Reserva Agrícola Nacional], apesar de ter afirmado que são salvaguardadas as “suas zonas mais críticas”.
“Em primeiro lugar, esta possibilidade traduz a profunda falha das políticas de ordenamento do território, de fiscalidade e de sustentabilidade, ao promover a expansão em mancha de óleo de mais zonas urbanizadas, em detrimento da ocupação de edifícios devolutos, que deveriam ser recuperados e reabilitados, ou de zonas infraestruturas ainda não ocupadas”, afirma a Zero.
No comunicado, a associação cita também um relatório deste ano da OCDE no qual Portugal é o terceiro país (da Organização para a Cooperação e Desenvolvimento Económico) com maior número de fogos (574) por mil habitantes, a seguir a Itália e França, além de estar no topo também em maior percentagem de alojamentos vagos.
Com a mudança da lei, alerta a Zero, ficam em causa princípios de ordenamento do território e estatutos de proteção de âmbito nacional, sendo as decisões sujeitas a interpretações diferenciadas das Assembleias Municipais, arriscando-se a construção em solos agrícolas e ambientalmente importantes, e até em áreas classificadas.