Júlio Quintela

Chief Operations Officer da Zome

Opinião

Crescer ou sufocar? O erro de planeamento que está a sair caro

11 Fevereiro, 2025 · 09:48

A crise da habitação em Portugal não se resolve com mais casas no mesmo sítio. Resolve-se com mobilidade, urbanismo e visão estratégica.

Durante os anos em que trabalhei na TomTom, onde tive a oportunidade de estudar mobilidade e tráfego urbano a nível global, ficou claro que as cidades que conseguiram manter habitação acessível tinham um denominador comum: infraestruturas de transportes que permitem descentralizar o crescimento sem comprometer a qualidade de vida.

Portugal continua a ignorar esta realidade e insiste em cometer os mesmos erros de sempre. Em vez de expandirmos as cidades com planeamento estratégico, estamos a sufocá-las.


"A habitação acessível não é só uma questão de imóveis. É um problema de mobilidade."


A narrativa atual foca-se nos preços das casas, na falta de oferta e nos incentivos fiscais. Mas onde está a discussão sobre crescimento urbano sustentável?

– Os principais centros urbanos estão saturados, mas os subúrbios continuam mal conectados.
– Infraestruturas como o TGV são vistas apenas como projetos de mobilidade, em vez de catalisadores de desenvolvimento urbano.
– O licenciamento de novas habitações continua a ser um processo burocrático que favorece a especulação.

A decisão de concentrar tudo nos mesmos eixos urbanos apenas alimenta a bolha imobiliária, aumenta os tempos de deslocação e limita as opções para quem procura casa.

O que outras cidades fizeram diferente?

Ao longo da minha carreira, tive a oportunidade de trabalhar e viver em países como os EUA, Brasil, Espanha, entre outros, analisando como diferentes cidades lidaram com o problema da habitação.

– Boston: Criou novos núcleos urbanos como Cambridge e Somerville, investindo em transporte público para conectar essas áreas ao centro.
– Madrid: Expandiu o metro para regiões periféricas, permitindo que mais pessoas tivessem acesso a habitação acessível sem sacrificar tempo de deslocação.
– Toronto: Usou a sua rede ferroviária para incentivar o desenvolvimento de novas áreas urbanas, sem sobrecarregar o centro da cidade.

O que estas cidades têm em comum?
– Transportes eficientes que permitem que o crescimento urbano seja descentralizado.
– O planeamento urbanístico está alinhado com a mobilidade, criando novas zonas habitacionais.
– Os preços das casas mantêm-se mais equilibrados, pois não há pressão excessiva sobre poucas áreas.

Portugal poderia aplicar estas lições, mas insiste em concentrar tudo nas mesmas zonas, repetindo erros que outras cidades já corrigiram há décadas.

Mobilidade como solução para a crise da habitação

O discurso sobre habitação acessível precisa de uma mudança urgente. Não basta construir mais casas – é preciso garantir que estão inseridas num ecossistema urbano funcional.

– Se os transportes públicos fossem eficientes, as famílias poderiam viver mais longe dos centros sem perder qualidade de vida.
– Se os novos projetos imobiliários fossem integrados com infraestruturas de mobilidade, os preços seriam mais equilibrados.
– Se o crescimento urbano fosse pensado para 30 ou 40 anos, e não para ciclos eleitorais, evitaríamos este problema recorrente.

Portugal tem tudo para fazer melhor. Mas, para isso, é preciso parar de construir cidades para o passado e começar a planeá-las para o futuro. 


"Portugal tem tudo para fazer melhor. Mas, para isso, é preciso parar de construir cidades para o passado e começar a planeá-las para o futuro."


O que está a faltar?

O problema da habitação acessível em Portugal não se resolve apenas com incentivos fiscais ou mais construção. Resolve-se com uma nova mentalidade urbanística, onde habitação e mobilidade caminham lado a lado.

– Infraestruturas como o TGV, o metro e os comboios urbanos devem ser usados para criar novos polos habitacionais, não para congestionar os já existentes.
– O planeamento urbano precisa de uma visão de longo prazo, evitando que as cidades fiquem reféns da especulação imobiliária.
– A descentralização do crescimento urbano é a única forma de equilibrar oferta, procura e preços.

Enquanto continuarmos a repetir os mesmos erros, os preços das casas continuarão a subir, a mobilidade continuará a piorar e a qualidade de vida continuará a ser um luxo para poucos.

Portugal precisa de fazer diferente. Está na hora de pensar grande.

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