Cinco anos depois: O que mudou desde que ficámos em casa?
Março 14, 2025 · 5:27 pm
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Há cinco anos, o mundo parou. De um dia para o outro, o impossível tornou-se real: ruas desertas, cidades em silêncio e milhões de pessoas fechadas em casa.
O que começou como uma notícia distante sobre uma pneumonia misteriosa na China transformou-se numa pandemia global que nos obrigou a redefinir tudo. Desde a forma como trabalhamos até à maneira como nos relacionamos, os impactos da COVID-19 foram tão profundos que ainda hoje os sentimos – e sentiremos por muito tempo.
Entre paredes: o impacto do confinamento
Ficar em casa parecia um desafio passageiro, talvez até apetecível para alguns, mas rapidamente se tornou numa prova de resistência. As relações foram testadas ao limite, os divórcios dispararam e o isolamento dos mais velhos atingiu proporções alarmantes. Os mais novos viram a escola transferida para um ecrã, com efeitos que só agora começamos a compreender.
A saúde mental, tantas vezes relegada para segundo plano, revelou ser um dos campos de batalha mais duros da pandemia. Ansiedade, insónias, depressão: sintomas de um tempo que exigiu mais de nós do que imaginávamos.
O espaço doméstico deixou de ser apenas um lar para se tornar escritório, escola, ginásio e, em muitos casos, uma prisão invisível. Quem tinha um jardim ou uma casa espaçosa enfrentou o confinamento de forma diferente de quem vivia num apartamento exíguo, onde cada metro quadrado era partilhado por várias pessoas. A desigualdade nunca foi tão evidente – nem tão sentida.
O impacto na economia e no mercado de trabalho
O teletrabalho deixou de ser um privilégio para se tornar uma necessidade. As empresas adaptaram-se à pressa, reinventaram-se, e muitos trabalhadores tiveram de aprender a equilibrar reuniões virtuais com crianças a pedir atenção.
No entanto, nem todos puderam ficar em casa: alguns asseguraram os cuidados de saúde e muitos outros invisíveis garantiram serviços para todos. Contudo, também o encerramento de negócios e a falência de empresas geraram uma onda de desemprego sem precedentes, que afetou especialmente os mais jovens, os menos escolarizados, e os trabalhadores precários.
O mercado de trabalho mudou para sempre. A digitalização acelerou, o teletrabalho tornou-se parte do vocabulário comum e algumas profissões nunca mais voltaram ao que eram.

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A transformação do mercado imobiliário
O setor imobiliário sofreu mudanças profundas. Com mais pessoas a trabalhar a partir de casa, aumentou a procura por habitações maiores e em zonas menos densamente povoadas. O mercado português, tal como em outros países, assistiu a um crescimento dos preços das casas e a uma alteração das preferências dos compradores.
A arquitetura e o design de interiores também acompanharam esta evolução. Espaços abertos e multifuncionais, varandas e jardins passaram a ser mais valorizados, enquanto soluções tecnológicas para casas inteligentes ganharam popularidade. O conceito de habitação flexível, que permite adaptar os espaços às diferentes necessidades do dia a dia, tornou-se uma tendência.
Se antes a localização central era o fator mais importante, a qualidade do espaço ganhou um novo protagonismo. Muitas famílias saíram dos centros urbanos e optaram por um estilo de vida diferente, em áreas mais rurais, privilegiando o contacto com a natureza.
Enquanto alguns conseguiram poupar durante a pandemia, outros enfrentaram dificuldades económicas. O acesso à habitação continua a ser um dos desafios mais prementes, e a recuperação do setor ainda está em curso.
E tudo a Covid-19 mudou
O mundo mudou e uma nova realidade instalou-se à força. Enquanto tentávamos acordar de uma distopia improvável, descobríamos que este era afinal o novo normal. As relações pessoais dependiam de zooms e webex, não nos reconhecíamos atrás das máscaras e do distanciamento, o medo isolou-nos e condenou milhões à solidão.
As ruas vazias pareciam eternas madrugadas, a loucura do lá fora, instalou-se no cá dentro, entre malabarismos quotidianos.
A pandemia alterou padrões de consumo e lazer. Restaurantes e bares tiveram de se reinventar com serviços de take-away e entregas ao domicílio, mudanças que se mantiveram e transformaram permanentemente a forma como consumimos.
O streaming e as redes sociais tornaram-se os principais meios de entretenimento, enquanto a socialização presencial ficou em segundo plano. Milhares de nascimentos, aniversários, funerais aconteceram sem reunir alegrias ou partilhar lágrimas.
A pandemia da Covid-19 deixou um rasto de milhões de vítimas em todo o mundo. A Organização Mundial da Saúde (OMS) registou, até 2023, mais de 7 milhões de mortes — embora se estime que este número possa, na verdade, ser muito superior.
Em Portugal, mais de 25 mil pessoas perderam a vida devido à doença, mais de cinco milhões foram infetadas, realizaram-se 35 milhões de testes e administraram-se 22 milhões de vacinas a quase nove milhões de portugueses. A vacinação revelou-se fundamental para controlar a pandemia, permitindo reduzir a gravidade da doença e avançar para um regresso progressivo à normalidade.

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Cinco anos depois: o que aprendemos?
Apesar de todas as dificuldades, a pandemia trouxe lições valiosas. Aprendemos a valorizar mais o tempo em casa, a necessidade de equilibrar vida pessoal e profissional e a importância do bem-estar mental. Hoje, cinco anos depois, a resiliência das pessoas e das comunidades é visível na forma como se adaptaram e reinventaram.
O mundo digital tornou-se ainda mais presente no nosso quotidiano. As compras online dispararam, a telemedicina ganhou espaço e a educação à distância provou ser uma alternativa viável em situações de emergência. No entanto, também percebemos a importância do contacto humano, do toque, da gargalhada e da vida em comunidade, algo que muitos procuram ainda recuperar.
Mas numa pandemia que acentuou as desigualdades, é também de vidas desiguais que se fazem os recomeços.
Quando muitos acreditavam que, enquanto sociedade, sairíamos desta provação coletiva mais fortes, empáticos, unidos, acabámos por mostrar o mesmo de sempre: enquanto espécie, somos capazes do melhor e do pior. Das mais inspiradoras e generosas formas de dar, às mais mesquinhas incapacidades de ver os outros e sermos empáticos. Muitas feridas ainda estão por sarar e os efeitos económicos e sociais levarão anos a dissipar-se.
A grande questão permanece: estamos preparados para o futuro? Se há algo que estes anos nos ensinaram, é que a única certeza é a mudança. E, tal como há cinco anos, o mais importante continua a ser a capacidade de nos ajustarmos e seguirmos em frente.
Voltámos a abraçar amigos sem hesitar, a viajar sem restrições e a beijar sem máscaras. Sobrevivemos ao medo, ao isolamento e à incerteza. E, talvez mais importante, aprendemos a nunca mais dar por garantido o privilégio das coisas simples. Tão simples como sair de casa.
Cronologia breve de uma pandemia
2020
- 11 março – OMS declara a Covid-19 como pandemia.
- 12 março – Suspensão das atividades presenciais nas escolas; encerramento de discotecas; restrições na restauração e centros comerciais.
- 16 março – Primeira morte no país.
- 18 março – Presidente da República decreta estado de emergência, impondo confinamento obrigatório e restrições à circulação.
- 2 abril – Proibição de deslocações fora do concelho na Páscoa e encerramento de aeroportos a voos de passageiros.
- 30 abril – Governo anuncia plano de transição do estado de emergência para calamidade, iniciando reabertura faseada.
- 15 maio – Regras para praias anunciadas; máscaras obrigatórias nas escolas e transportes a partir dos 10 anos.
- 3 agosto – Primeiro dia sem mortes por Covid-19 desde março.
- 14 outubro – Portugal volta à situação de calamidade; ajuntamentos e eventos familiares limitados.
- 28 outubro – Uso obrigatório de máscaras em espaços públicos.
- 31 outubro – Confinamento parcial em 121 concelhos com mais de 240 casos por 100 mil habitantes.
- 5 novembro – Presidente propõe estado de emergência, permitindo restrições à circulação e requisição de privados.
- 9 novembro – Recolher obrigatório nos concelhos mais afetados.
- 21 novembro – Máscaras obrigatórias no trabalho; restrições na circulação nos fins de semana prolongados.
- 7 dezembro – Portugal ultrapassa as 5.000 mortes por Covid-19.
- 17 dezembro – Celebrações de Ano Novo canceladas; horários da restauração mantêm-se no Natal.
- 27 dezembro – Início da vacinação em Portugal.
2021
- 12 janeiro – Estado de emergência renovado até 30 de janeiro, garantindo livre circulação para presidenciais.
- 18 janeiro – Portugal é o país com mais novos casos por milhão de habitantes.
- 21 janeiro – Encerramento das escolas e outras instituições por 15 dias.
- 28 janeiro – Controlo de fronteiras terrestres e limitação de circulação.
- 5 março – Portugal ultrapassa um milhão de vacinas administradas.
- 1 abril – Reabertura de escolas e esplanadas com restrições.
- 19 abril – Terceira fase do desconfinamento; restrições mantidas em 10 concelhos.
- 30 abril – Fim do estado de emergência após 173 dias consecutivos.
- 9 junho – Parlamento Europeu aprova Certificado Digital Covid-19.
- 25 junho – Metade da população vacinada com pelo menos uma dose.
- 20 agosto – Transição de estado de calamidade para contingência; alívio de restrições.
- 23 setembro – Anúncio da última fase de desconfinamento a 1 de outubro: fim de limites de lotação e horários.
2022
- 19 janeiro – Portugal ultrapassa dois milhões de infeções desde março de 2020.
- 2 fevereiro – Portugal ultrapassa as 20.000 mortes associadas à Covid-19.
- 17 fevereiro – Alívio das medidas: fim da exigência de testes para bares, discotecas e eventos; teletrabalho deixa de ser recomendado; fim das limitações de lotação nos espaços comerciais; máscaras ainda obrigatórias em espaços fechados.